segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

verão.




Foi o Neruda quem me disse hoje de manhã: A timidez é uma condição estranha da alma, uma categoria e uma dimensão que se abre para a solidão. Também é um sofrimento inseparável, como se a gente tivesse duas epidermes e a segunda pele interior se irritasse e se contraísse diante da vida. Entre as estruturações do homem, esta qualidade ou este defeito são parte do amálgama que vai fundamentando, numa longa circunstância, a perpetuidade do ser.


Aí, olhei o mar pela janela. É muita luz e calor. Tanta que quase tenho vontade de viver, de ser feliz. E não vendo nada meu nisso, recordo o quanto tenho me escondido aqui. Não é a casa que me prende, suas paredes são frágeis, inúteis até. Lá fora, o mundo e seus sedutores desafios, assuta menos agora. Eu desenvolvi uma certa desconfiança de tudo, um desinteresse crônico, nervoso, insuportavelmente mudo. Ninguém percebe. Há sorrisos, falares, quase esperanças... por dentro é nostalgia impregnada de vazio.


O movimento da rua, a badalação das vitrines onde as outras pessoas se escondem - por mais q elas pensem que estão se mostrando, não estão mesmo!... O lá fora não me comove. Eterna sonhadora edifiquei um castelo de mágoa e desdém...


Talvez eu precise mesmo de um pouco de Sol. Não pode haver vida na Lua sem isso. Minha alma se desepera, não aceita. Paganismo e anarquismo do meu coração ternamente incomum. Se eu aceitasse simplesmente, não haveria essa resignação. Quando uma mulher se dobra ao destino, sua alma não consegue mais cantar. Sei que desafino. É teimosia mesmo.


Diante de mim, quem pode suspeitar?


A minha solidão esterelizou tudo. Os versos, a força que normalmente as pequenas gentiliezas têm sobre a manutenção do amor... nada sobrevive impune. Mudei de sonhos. Os planos são outros. A casa também. Mas, como disse, paredes para mim são como a fumaça tênue e insignificante... as atravessaria, se quisesse...
Da antiga coleção de segredos, restaram os caquinhos. Vou jogar tudo fora. Sem pena. Sem dor. E pensando nisso, arrebata-me uma vontade de rasgar os vestidos também, desfazer os laços, desarrumar os livros. Tirar-mostrar-limpar! Pra que eu quero tanto por dentro, escondido? Essa timidez sonsa, morna, dissimulada... Ilusões sem cor podem me atingir? O que o olhar alheio conseguiria? Nunca foi medo dele. Embora ultimamente...
É hora da faxina dentro de mim...

Um comentário:

  1. Adorei a citação de Neruda...mas o seu texto está profundo e bonito, consegui visualizar a mulher em uma metamorfose; aqui realmente houve um extravazamento...belíssimo.

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